Falar de direitos humanos é falar de pessoas com deficiência!
Data de publicação: 7 de abril de 2025
O segundo e último dia de atividades do Seminário Nacional Serviço Social e a Luta Anticapacitista começou, em Recife (PE), neste sábado (5), com uma apresentação cultural do grupo Fulô da Mata, que promoveu uma roda de coco no auditório do evento. O evento foi transmitido ao vivo pelo canal do CFESS no YouTube (com Libras) e pelo canal do CRESS-PE no YouTube (com audiodescrição).
A primeira mesa de debate teve como tema a “Ética e Luta Anticapacitista”, com as assistentes sociais Kelly Melatti, presidenta do CFESS, e Fernanda Ferreira, trabalhadora do sociojurídico no Piauí e pessoa autista.
A presidenta do CFESS trouxe como pauta os fundamentos éticos que embasam a luta anticapacitista no Serviço Social e a reflexão sobre a atuação profissional no atendimento às pessoas com deficiência. Segundo ela, é central pensar em ética e história, na capacidade da humanidade de criar valores a partir das construções históricas.
“Nossa implicação na luta anticapacitista é intrínseca, pois carrega em si uma dimensão ética. O convite aqui é para que nós, assistentes sociais, possamos fazer a reflexão ética, com a sustentação do valor da liberdade e dos princípios de nosso Código de Ética, portanto, das possibilidades de pessoas com deficiência de existir eticamente”, reflete Kelly.
Fernanda Costa pautou, ainda, a garantia do direito à acessibilidade nos espaços sócio-ocupacionais em consonância com o modelo social da deficiência; debatendo o lugar do Serviço Social no debate da deficiência, apresentando, inclusive, sugestões de práticas profissionais anticapacitistas.
“Não há como se falar em direitos humanos, elemento básico da atuação profissional de assistentes sociais, sem falar em direitos das pessoas com deficiência. Exemplo disso é que, em seus princípios fundamentais, o nosso Código de Ética coloca que é preciso exigir da categoria empenho na eliminação de todas as formas de preconceito”, relembra Fernanda.
Avaliação biopsicossocial em pauta
A última mesa apresentou um “panorama sobre a avaliação biopsicossocial de deficiência”, com a assistente social Fábia Halana e a psicóloga Vitória Bernardes. A mesa também contou com a participação, em vídeo, do assistente social Wederson Santos.
As palestras abordaram sobre a necessidade da regulamentação do Artigo 2º da Lei Brasileira de Inclusão (LBI), que trata da avaliação biopsicossocial da deficiência e a sua interface com as políticas públicas. “É preciso compreender que, quando se fala em avaliação biopsicossocial, significa um processo de luta pela mudança de hegemonia do modelo médico para o modelo social, uma vez que a experiência da deficiência é permeada por estigmas, preconceitos, opressões e exclusões historicamente construídos”, explica Wederson Santos por meio de um vídeo enviado ao evento.
Ou seja, a desigualdade da deficiência está para além do corpo, para além de questões de saúde. “Então, o modelo social faz esse deslocamento do indivíduo para a sociedade, para explicitar a causalidade da deficiência. Então, a deficiência seria uma construção social, uma expressão da desigualdade”, analisa Wederson.
Acesse a gravação do evento e confira o vídeo
Fábia Halana avaliou que as barreiras institucionais e culturais no Brasil ainda reforçam o modelo biomédico da deficiência. Segundo ela, enquanto o chamado modelo médico é limitado por sua visão restrita, focando exclusivamente nos aspectos orgânicos da deficiência e centrado no binômio normalidade-anormalidade do corpo, ignorando as influências dos fatores contextuais, o modelo biopsicossocial reconhece que a deficiência resulta da interação entre as condições de saúde da pessoa e os fatores contextuais (pessoal e ambiental). A deficiência é, portanto, uma consequência de barreiras sociais e ambientais que restringem a participação plena na sociedade.
Assim, ela acrescentou que a atuação profissional de assistentes sociais envolve entrevistas, analisa condições socioeconômicas e articula políticas públicas, para viabilizar direitos e acesso a serviços essenciais, dentro de uma perspectiva biopsicossocial da deficiência. “É justamente por isso que se torna fundamental que a categoria se mobilize pela implantação da Avaliação Biopsicossocial Unificada da Deficiência no Brasil”, observa Fábia.
A terceira contribuição na mesa foi da psicóloga Vitória Bernardes, que brincou, se dizendo uma “infiltrada” no debate, mas alinhada na mesma direção da luta anticapacitista do Serviço Social. Para Vitória, não há como falar da deficiência sem falar de gênero, raça, tendo em vista que as estatísticas deixam nítido que a maioria das pessoas com deficiência é de mulheres, negras e pobres.
Para ela, portanto, os indicadores no Brasil demonstram que as pessoas com deficiência experimentam as piores condições em todos os marcadores sociais, seja na educação ou no trabalho, destacando a necessidade urgente de intervenção estatal para eliminar essas barreiras e promover uma sociedade mais inclusiva. “Então, como fortalecer a avaliação biopsicossocial? Precisamos tornar públicas quais são as barreiras que impedem nossa participação. Isso que a avaliação biopsicossocial vai nos dar, inclusive para entendermos que políticas públicas são necessárias de serem construídas”, afirma Vitória.
Violência contra mulheres com deficiência
O seminário nacional contou com a presença de representantes do Movimento Brasileiro de Mulheres Cegas e com Baixa Visão (MBMC). Denise Santos Silva, integrante do comitê anticapacitista do CRESS-PI e do coletivo Serviço Social Anticapacitista, é a coordenadora executiva nacional do MBMC.
Com objetivo de informar meninas e mulheres com deficiência, assim como agentes de segurança pública e integrantes das diferentes redes de proteção e defesa de direitos das mulheres, sobre a importância de inserir, nos registros de ocorrências criminais, a condição de deficiência da vítima, o MBMC lançou a campanha “Mulher com deficiência que sofrer violência precisa ter informada sua condição no boletim de ocorrência”.
“Convidamos todas as pessoas e instituições a se juntarem a nós nesse movimento de reconhecimento da importância dessa informação, para que se efetivem políticas públicas de enfrentamento à violência contra mulheres e meninas com deficiência a partir de dados reais”, informa Denise.
A mesa de encerramento contou com a participação do CFESS, do CRESS-PE e do Coletivo Serviço Social Anticapacitista. A conselheira do CFESS Emilly Marques celebrou a realização desse marco histórico para a profissão. “De forma ousada e aguerrida, a gente conseguiu ter 64 assistentes sociais com deficiência presencialmente aqui no evento. Isso demonstra que estamos nos movimentando, que estamos avançando. Na nossa diversidade, com os desafios que temos, como já afirmávamos em campanha do conjunto CFESS-CRESS, sem movimento não há liberdade!”, finalizou Emilly.
O seminário nacional contou com a participação de quase 400 pessoas de todo o Brasil, dentre assistentes sociais, estudantes de Serviço Social e profissionais de outras áreas. As filmagens dos dois dias de atividades estão disponíveis no canal do CFESS no YouTube (cfessvideos).
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